DIPLOMACIA NO SÉCULO XX
AULA 05
Desenrolar da Diplomacia e as suas funções
C) Negociação (1)
1. Conceito de negociação diplomática
A negociação internacional, em uma noção muito genérica, traduzir-se-ía nos contatos entre Estados para concertarem entre si a realização de interesses comuns ou recíprocos. Em sentido mais restrito, a negociação internacional seria a concertação entre Estados para se chegar a um acordo, geralmente escrito, sobre qualquer problema específico.
Estamos, pois, em presença de dois conceitos de negociação Internacional, um mais amplo, que cobre todos os variados contatos entre Estados com vista a uma possível concertação de pontos de vista ou atitudes e a que poderemos chamar negociação informal e que constitui grande parte da atividade normal do agente diplomático; e outro mais restrito, que respeita apenas aos contatos entre Estados, através de um mecanismo especialmente montado para o efeito, com vista à celebração de um acordo, geralmente escrito, sobre um problema específico de interesse comum ou recíproco, que poderemos designar por negociação formal.
A negociação internacional, quer seja informal ou formal, pode revestir duas formas distintas: tratar-se de uma negociação feita diretamente pelos detentores do poder político, e neste caso estamos em presença daquilo a que chamamos negociação direta; ou tratar-se de uma negociação feita por intermediários, e neste segundo caso estamos em presença da verdadeira negociação diplomática. Focada sobre outro aspecto esta pode ser ainda de duas espécies: bilateral ou multilateral consoante as partes negociadoras são dois ou mais Estados.
O autor norte-americano Fred Charles Iklé define a negociação internacional de caráter formal como "o processo pelo qual propostas explícitas são apresentadas ostensivamente com o objetivo de alcançar um acordo pela troca ou pela realização de um interesse comum onde existem interesses opostos ou em conflito" (1). Para este autor, pois, não existe negociação sem a presença de um conflito de interesses que é resolvido pela criação de um interesse comum.
A seu turno, o autor francês Alain Plaintey, numa obra recente sobre a negociação internacional, adota a definição de outro autor francês, L. Constantin, aliás concebida para a negociação no setor privado, segundo a qual a negociação seria "o conjunto de práticas que permitem compor pacificamente os interesses antagônicos ou divergentes de grupos ou entidades sociais autônomas" (2).
Nesta última definição, a par com os conflitos de interesses ou interesses opostos, referem-se os interesses divergentes o que, quanto a nós, constitui já uma melhoria em relação à primeira definição que considera que uma negociação pressupõe sempre um conflito de interesses. Com efeito, quando existem apenas interesses divergentes de dois Estados em relação a um ou a um conjunto de problemas, pode verificar-se a necessidade de negociação sem que exista, na realidade, um conflito ou oposição de interesses.
Se bem que na grande maioria das negociações internacionais se verifique a presença de oposição ou divergência de interesses não consideramos, porém, como essencial para a definição de negociação internacional a presença ou confrontação de interesses opostos ou divergentes.
Para melhor se compreender este ponto de vista citamos dois exemplos.
No primeiro exemplo os Estados A e B celebram entre si um acordo de assistência mútua pelo qual ambos se comprometem a auxiliar-se mutuamente no caso de agressão de algum deles por um terceiro Estado. Supondo que este acordo não contém outras condições substantivas senão aquelas que estabelecem a obrigação recíproca de ajuda, estamos em presença de um acordo que resultou de uma negociação que teve por objetivo a concertação entre os dois Estados acerca de um problema de interesse mútuo não estando presente qualquer oposição ou divergência de interesses.
No segundo exemplo os Estados A e B pretendem ser designados membros de duas comissões diferentes da ONU e estabelecem um acordo entre si para se apoiarem mutuamente nas suas candidaturas. Não existe neste caso qualquer oposição de interesses entre ambos os Estados pois pretendem ser membros de comissões diferentes. Poderá dizer-se, no entanto, que existem interesses divergentes dos dois Estados que são reduzidos por via de uma negociação a um interesse recíproco que é o apoio mútuo.
Observamos também, de passagem, que no primeiro exemplo se menciona uma negociação de tipo formal e no segundo, uma negociação de tipo informal.
Como se poderá verificar, os casos que acabamos de citar não cabem ambos nas definições de lklé e de Constantin, mas cabem, perfeitamente, porém, nas definições por nós avançadas de uma negociação internacional entendida como uma concertação entre Estados para se chegar a um acordo sobre um problema de interesse comum ou recíproco que quando é conduzido por intermediários ou agentes diplomáticos se designa por negociação diplomática.
Vide
BRIGAGÃO, Clóvis. Estratégias
de Negociações Internacionais. Brasília: Aeroplano, 2002.
KISSINGER,
Henry. La
Diplomacia. México:
Fondo de Cultura Económica, 1999.
NYE, Joseph S. Understanding International Conflicts. Nova Iorque: Longman, 1997.
C. 2 Diplomacia Multilateral (2)
A primeira atuação de destaque que marcou esta posição se deu durante a
Segunda Conferência da Paz em Haia (1907), na qual a delegação brasileira foi
chefiada por Ruy Barbosa. O tema principal foi a criação de uma Corte
Internacional de Justiça. De acordo com as posições da Alemanha, Grã-Bretanha
e Estados Unidos, esta deveria ser formada por 16 países membros - dos quais
apenas 9 teriam assento permanente. Às repúblicas americanas caberia apenas um
lugar, de caráter rotativo.
Ruy Barbosa participou intensamente das discussões sobre arbitragem, e envidou
imensos esforços para assegurar um lugar permanente para o Brasil, com base no princípio
da igualdade das nações. Não obstante, as resistências das principais
potências mundiais impediu que se alterasse a composição do tribunal. Nem
mesmo a amistosa relação com os Estados Unidos contribuiu para aproximar as
posições das delegações brasileira e norte-americana. Foi nesta ocasião que
Ruy Barbosa deixou a marca de seu pensamento universalista, de forte influência
jurídica, liberal, na diplomacia brasileira.
Nos anos seguintes, o Brasil prosseguiu no seu empenho em assegurar uma presença em plano de igualdade com as potências internacionais. Esta preocupação, somada à crescente cooperação com os Estados Unidos, levou o país a assumir novas responsabilidades no sistema internacional.
A Corte de Haia, define um conflito como sendo todo desacordo sobre
certo ponto de direito ou de fato; toda contradição ou oposição de teses jurídicas
ou de interesses entre dois Estados.
Trata-se do estudo do mais extremo dos conflitos internacionais: a Guerra, fim das negociações diplomáticas.
1 Guerra
Apenas no século XX, a Guerra passou
a ser considerada como um ilícito internacional, pois, anteriormente, era uma
alternativa legítima para a resolução de pendências entre Estados.
Podemos defini-la como sendo a luta durante certo lapso temporal entre as forças armadas de dois ou mais Estados, dirigidas pelos seus governantes.
Apoio
vocabular:
Jus
in bello:
Direito aplicável na Guerra.
Jus
ad bellum:
Direito à Guerra (de fazer a guerra, quando esta parecesse justa). O Direito Internacional contemporâneo tolera os casos de legítima
defesa real contra uma agressão armada, e a luta pela autodeterminação de um
povo contra a dominação colonial.
Bélico:
concernente à Guerra.
Beligerante:
que está em Guerra.
-
Uma guerra tem início quando as forças armadas de um Estado, agindo a
serviço de seu governo, atacam o território ou as forças armadas de outro
Estado, com o intuito de conquista-lo ou de obriga-lo a proceder de acordo com a
sua vontade. Em síntese, pode-se considerar em guerra, aquele país que
teve sua soberania (povo, governo e território) atacada.
Com os atos de beligerância, surge, pois, o Estado de Guerra, que
acarreta certos efeitos, da seguinte ordem:
-
Relações
Diplomáticas sofrem rupturas.
-
Os
Tratados se anulam, exceto os de Guerra e os que estipularem esta hipótese com
suas conseqüências.
1.2
Evolução Normativa
O Pacto da Sociedade das Nações (1919), antecessor da ONU, limitou a
guerra, sem a proibir totalmente, como podemos observar pela leitura do seu
artigo 12, untengenannt (abaixo mencionado):
“Todos os membros da Sociedade concordam em que, se entre eles surgir controvérsia suscetível de produzir ruptura, submeterão o caso seja ao processo da arbitragem ou à solução judiciária, seja ao exame do Conselho. Concordam também em que não deverão, em caso algum, recorrer à guerra antes da expiração do prazo de três meses após a decisão arbitral ou judiciária, ou o relatório do Conselho.”
A seu tempo, o Pacto de Paris (Pacto Briand-Kellog, em 1928) condenava e renunciava a via bélica, colocando-a como via fora da lei (outlawry of war) conforme seu estatuto, in verbis:
“As altas partes contratantes declaram solenemente condenar o recurso à guerra como meio de solucionar conflitos internacionais, e renunciam a ela como instrumento de política nacional nas suas relações mútuas. As altas partes contratantes reconhecem que a solução de disputas ou conflitos de qualquer natureza ou origem que possam surgir entre elas deverá ser buscada somente por meios pacíficos.”
Fora neste desenrolar, que a Carta das
Nações Unidas, de 1945, proibiu formalmente a guerra, estabelecendo, em seu
artigo 2o. , parágrafo 4o., que:
“Os membros da Organização, em suas relações internacionais, abster-se-ão de recorrer à ameaça ou uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado, ou de qualquer outra forma incompatível com os propósitos das Nações Unidas.”
**
Recordamos, que o Direito Internacional contemporâneo tolera os casos de legítima
defesa real contra uma agressão armada, e a luta pela autodeterminação de um
povo contra a dominação colonial.
Por sua vez, vale mencionar que a OTAN é
o Tratado do Atlântico Norte ( www.nato.int
), cujo tratado fora firmado em Washington D.C., em 4 de Abril de 1949.
NOTAS:
(1)- Texto baseado nos escritos do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) - Gabinete de Informação e Imprensa - MNE - Missões Diplomáticas e Postos Consulares - A Missão Diplomática e as suas funções. Portugal: 2004.
(2)- Texto baseado nos escritos de Mônica Hirst. História da Diplomacia Brasileira. Brasil: Ministério das Relações Exteriores, 2004.
Vide
PORTO, Manuel
Carlos Lopes. Teoria da Integração e Políticas Comunitárias. Almedina,
Coimbra, Portugal, 2002.
KISSINGER, Henry. La Diplomacia. México: Fondo de Cultura Económica, 1999.
SARAIVA,
José Flávio Sombra. Relações Internacionais - dois séculos de história:
entre a preponderância européia e a emergência americano-soviética
(1815-1947). Brasília: IBRI, 2001.
(1) lklé, Fred Charles, How Nations Negotiate, Kraus Reprint Co., Millwood, Ncw York, 1976., p. 3 - 4.
(2) L. Constantin, Psycbologie de Ia négociation: économie privée, P. U. F., Paris, p. 35; cit. in Alain Plaintey,La Negociation Internationale - Principes e methodes, Centre National de Ia Rechercbe Scientifique, Paris, 1980, p. 18.
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A
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FREIRE
E ALMEIDA, D. DIPLOMACIA
NO SÉCULO XX
– Aula 5.
Brasil:
Maio,
2004.
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